Carolina Maria de Jesus estreou, em 1960, na cena literária brasileira com o meteórico livro Quarto de Despejo. Com a percepção aguçada sobre as estruturas de opressão e racismo que constituíam e seguem constituindo a reificação das mulheres pretas em um contexto reiterado de conquista e dominação, passados sessenta anos da estreia de seu Magnum Opus, o mesmo ecoou potente entre estudantes, professores e a comunidade externa do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (Ifma), através da peça teatral Carolinas no Quarto de Despejo, que ficou em cartaz na Instituição entre 2017 e 2020. Escrita com o afã de remover a trava de silenciamento que caíra sobre Carolina Maria de Jesus e sua obra-prima, a peça almejou evidenciar o racismo e as múltiplas formas de discriminação presentes na escola. Escrever a peça possibilitou-nos organizar estratégias antirracistas e produzir argumentos face à permanente disputa no campo das questões de gênero. Neste aspecto, as hierarquias de gênero e raça denunciadas no diário de Carolina foram desamordaçadas pelas personagens “Carolinas”, no plural: a “Escritora”, a “Mãe”, a “Militante” e a “Trabalhadora”, encenadas por aprendentes do Ifma. Pretensiosamente, a “Carolina Mãe” é encenada por um menino branco, que simboliza a opressão que os pretos sofreram em seu processo de escravização nas Américas. Em decorrência disso, temos as múltiplas violências de gênero que até hoje escritoras pretas sofrem, como o amordaçamento literário, a título de ilustração. Destarte, esta pesquisa básica, de objetivo exploratório e de abordagem qualitativa atravessa os meandros do lembrar, do esquecer e do silenciar, que são próprios da memória, baseando-se em teóricas como Angela Davis (2016), Conceição Evaristo (2020; 2005), Djamila Ribeiro (2017), Ecléa Bosi (1994), Germana Sousa (2012), Jéssica Dias (2008), Rafaella Fernandes (2019) e Sueli Carneiro (2003). Concluímos que infelizmente ainda não são suficientemente conhecidas as escritoras pretas brasileiras e que as questões de gênero que atravessam a luta antirracista são igualmente ainda deslegitimadas na escola, impondo-nos, como educadoras e educadores, o trabalho de friccionar a perspectiva dos feminismos plurais nos quais o gênero se apresenta reluzente como variável teórica oportuna.